Hoje, vamos falar sobre “McMindfulness: como a atenção plena se tornou a nova espiritualidade capitalista”!
Esse livro de Ronald Purser critica a obsessão moderna com o aperfeiçoamento pessoal.
Ele alerta para a rápida difusão das técnicas de meditação sem os simbolismos budistas, principalmente entre a população branca de alta renda.
Para se ter uma ideia: o mercado mundial da meditação foi projetado para alcançar 9 bilhões de dólares em 2027.
Venha refletir sobre quais os impactos de praticar McMindfulness!
O que é “McMindfulness”?
Segundo o livro, a "atenção plena contemporânea” ou “McMindfulness” se adaptou à cultura ocidental, promovendo:
pensar positivo sempre,
amar e acreditar em si mesmos a qualquer custo,
que, um dia, venceremos todos os nossos medos e ansiedades
que, um dia, alcançaremos o sucesso e a felicidade total.
Purser define esse conceito como:
“uma adaptação da meditação budista sob uma ótica capitalista e em conformidade com as normas sociais”.
Na prática, as sessões geralmente focam em técnicas de respiração e observação das sensações corporais.
Porém, não oferecem nada além de um relaxamento momentâneo.
E se tornam apenas um treinamento de concentração superficial e inativa, que ajuda as pessoas a lidarem com as situações e emoções ao longo do dia.
Porque é problemático?
Purser aponta que o primeiro problema de praticar “McMindfulness” é acreditar na ideia que as causas de todos os sofrimentos estão na mente e não no contexto social, político e econômico.
Os praticantes são incentivados a se desligarem do mundo para se concentrarem nas sensações e, assim, acabam "fetichizando o seu momento presente”.
O segundo problema, segundo o livro, é que essas técnicas são incorporadas por corporações,
As empresas as utilizam para seus próprios fins, sem levar em conta as dimensões éticas e espirituais que originaram essas práticas milenares.
As empresas podem promover a atenção plena para que os trabalhadores:
aumentem a produtividade e os lucros,
cultivem a civilidade e a disciplina,
não reajam a falta de ética, toxicidade, abusos ou falhas do sistema,
se submetam a demandas excessivas e injustiças.
Parece um exagero, mas você sabia que a meditação foi testada até em programas militares?
Houveram cerca de 10 milhões de dólares alocados para as forças especiais dos Estados Unidos a fim de avaliar se as técnicas de atenção plena fariam os soldados atirarem melhor (e fizeram!).
Leia mais:
Problema sistêmico
O grande objetivo do livro é indicar que, no momento atual, a meditação está desempenhando uma função ideológica, principalmente através da prática nas corporações.
Os trabalhadores praticantes de “McMindfulness” aprendem a ignorar sentimentos ruins ao se focarem nas sensações do corpo.
Conforme praticam, eles celebram as evoluções individuais enquanto ignoram a perda das liberdades políticas e econômicas.
E, assim, se integram e consentem a sistemas que, na verdade, contribuem para a própria ansiedade e depressão que estão tentando superar.
Segundo Purser,
“essa prática desvia a atenção dos questionamentos, das injustiças estruturais e sistêmicas, culpando a vítima”.
Essa ideia também foi muito bem articulada por esses dois outros pensadores citados no livro:
“A meditação budista ocidental é indiscutivelmente a maneira mais eficiente de participarmos plenamente da dinâmica capitalista, enquanto mantemos a aparência de sanidade mental”
Do livro: “Western Marxism to Western Buddhism“, Slavoj Žižek, filósofo esloveno
“O trabalho incessante de auto-aperfeiçoamento assemelha-se ao protestantismo. Agora, em vez de procurar pecados, caça-se pensamentos negativos. O ego luta consigo mesmo como um inimigo. Hoje, até mesmo pregadores fundamentalistas agem como gerentes e coachs motivacionais, proclamando o novo Evangelho de realização e otimização”.
Do livro: “Psychopolitics”, Byung-Chul Han, filósofo sul-coreano
McMindfulness vs Budismo engajado
As técnicas da meditação podem tornar as pessoas mais conscientes, mas não vão magicamente torná-las melhores ou mais empáticas.
Por isso, em resposta ao McMindfulness, surgiu o movimento do Budismo engajado, originado pelo monge vietnamita Thích Nhất Hạnh.
Então, de um lado, temos a "atenção plena contemporânea",
anti-budista,
anti-revolução,
anti-reforma,
pró-capitalista.
E, do outro lado, o Budismo engajado que tem como objetivo analisar e corrigir a opressão socioeconômica, sem medo de desafiar e criticar o sistema.
Como evitar McMindfulness?
A meditação cultiva o autoconhecimento e a percepção da realidade como ela é, sem as ilusões da mente.
Se sentir mais produtivo, disciplinado e concentrado são consequências naturais.
Então, como saber se o que você pratica é “McMindfulness”?
De tempos em tempos, questione-se!
Estou sempre ignorando…
sentimentos negativos?
pessoas tóxicas ou abusos?
o sofrimento alheio?
os ensinamentos budistas?
as dimensões sociais e éticas da meditação?
Pratico meditação com o objetivo de…
cumprir metas?
ser mais produtivo no trabalho?
solucionar meus problemas rápido?
me desapegar de coisas ou pessoas?
Por fim, o livro de Purser destaca que a meditação no contexto espiritual traz ensinamentos valiosos que podem melhorar as condições da sociedade.
Porém, para isso, é necessário evitar dogmas e pensar criticamente.
É essencial cultivar o engajamento e não só o desapego.
Veja mais:
Livro - Ronald E. Purser (2019). “McMindfulness: How Mindfulness Became the New Capitalist Spirituality”.
Global Meditation Market Expected To Reach $ 9.0 Billion Growth By 2027
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